A gripe do Paul

by Diário do Vale

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Aquele foi mais um verão abafado e úmido na sempre chuvosa Liverpool.
Mother Mary não cansava de recomendar ao filho adolescente para não pegar chuva, mas seu discurso era como chover no molhado. Naquele início de férias ele voltou todo dia pra casa encharcado, chutando poças d’água e cantarolando refrões de suas musicas preferidas.

Well, it’s one for the money,
Two for the show,
Three to get ready,
Now go, cat, go…

Até se esforçou para imitar o requebrado pélvico do Rei Elvis, mas não funcionou muito bem. Seguiu chutando as poças de água que corriam apressadas rua abaixo.
Entrando em casa os espirros sequenciais deram uma amostra do que o esperava nos próximos dias. Sua mãe iniciou um discurso em loopping infinito sobre como ele não cuidava da própria saúde, mas ele cantarolou em voz alta um refrão qualquer de algum artista qualquer para não ter que ouvir o que já sabia de cor.
Dia 06 de julho de 1957 surgiu radiante no horizonte, com alguns discretos feixes de sol penetrando corajosos a massa compacta de nuvens que era parte indissociável do céu plúmbeo da cidade. Paul levantou tarde nesse dia, não apenas por estar de férias, mas porque ardia em febre.
– Justo hoje, sábado…
Era o dia da festa da Igreja de San Peter e Paul não poderia perder esse dia. Diversos artistas iriam se apresentar e dentre eles uma banda que queria muito ouvir, uma tal de The Quarrymen.
Paul tentou mascarar a febre e fingir disposição, mas Mother Mary, como toda mãe que se preze, conhecia muito bem o filho e vetou qualquer extravagância noturna naquele dia. Era cama e ponto final.
Naquela noite de 6 de julho de 1957 Paul ficou trancafiado em casa, com febre, devorando histórias em quadrinhos.Naquela noite ele não assistiu os Quarrymen, nem foi apresentado a um guitarrista talentoso e um tanto esquisito, chamado John Lennon.
E como não existiria Beatles sem Lennon com McCartney, não houve Love me do, nem Hey Jude, nem She Loves You, nem Something, nem anything. Não houve Beatles, nem Beatlemania.
Não houve nem nunca haveria Yesterday, nem hoje nem ontem.
Let it be.
Também não houve Paul depois dos Beatles, nem John com Yoko.
Imagine.
Talvez John Lennon estivesse vivo agora. Talvez Paul não.
Talvez o mundo fosse um pouco mais triste. Talvez um monte de outras bandas nem tivessem existido.
Porque os Beatles não teriam existido se não tivesse existido aquele 6 de julho de 1957 em que Paul McCartney foi apresentado à John Lennon.
É estranho imaginar o quanto um episódio corriqueiro pode mudar o destino de tanta coisa.
Que bom que Paul McCartney não ficou gripado no verão de 1957.

 

ALEXANDRE CORREA LIMA| [email protected]

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2 comments

Cidadão Kane 14 de abril de 2018, 15:07h - 15:07

A maior banda Rock de todos os tempos. Vivi, curti muito, e ainda apesar dos 80 nas costas, adoro não só os Beatles como os Stones. Gosto tanto que fiz questão de ir conhecer Liverpool na Inglaterra, e não perco um Rock in Rio, onde me misturo no meio da molecada, com meus cabelos grisalhos juntamente com minha amada que também curte muito. Belo artigo Alexandre.

MAURO SILVA 10 de abril de 2018, 18:22h - 18:22

É realmente interessante como os fatos acontecem durante nossas vidas, sem que possamos, sobre eles, ter qualquer controle. Mas, de uma coisa tenho certeza: vivi a época dos Beatles, em todo o seu esplendor, pelo quê sou grato a esta maravilhosa banda de rock. Suas músicas jamais serão esquecidas. Foi um período maravilhoso que marcou os seus fãs. Tenho saudades!!

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