A Definitiva Cia de Teatro surgiu em 2008 dentro da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), no curso de Teatro, onde estudavam a maioria dos seus integrantes, que tinham o desejo de investigar a relação entre a música e a cena teatral, além do limite sobre o que se entende como teatro musical e suas variações – “teatro musicado”, “teatro com música” – bem como os seus tensionamentos como é o caso do teatro chamado “épico”.
A partir das primeiras décadas do século XX o conceito de teatro épico, que diz respeito a um teatro didático que procura uma distanciação entre personagem e espectador para que este seja capaz de refletir e apreender a lição social proposta, foi sendo apontado pelo poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898-1956).
Brecht, opondo-se ao teatro clássico, elabora um teatro narrativo que em vez de suscitar emoções e sentimentos desperta uma atitude crítica. Visando instruir os espectadores e incitá-los a se tornarem sujeitos diante das situações do mundo, alertando-os para a condição humana. Para ele o espectador deve ter um olhar crítico para se aperceber melhor de todas as formas de injustiças e de opressões.
Para reforçar essa estranheza e esse desconforto, que acaba por conduzir a uma aproximação entre o ator e o espectador, na medida em que os dois se distanciam em relação à história narrada e podem, como pessoas reais, discutir o que se passa na cena que chega não só através das falas, mas também através da música, que a companhia carioca aproxima sua pesquisa da elaborada por Bertolt.
Dentro da trajetória do grupo A HORA DA ESTRELA significa um passo bastante significativo; depois de passar por uma montagem de um musical brasileiro clássico – “Calabar, o elogio da traição”, de Chico Buarque e Ruy Guerra – onde buscou entender a função da música dentro deste tipo de dramaturgia que já difere do musical americano onde as canções substituem diálogos, por exemplo, a Cia. se debruçou sobre um épico – “Deus e o diabo na terra do sol”, de Glauber Rocha – onde a função narrativa da música era investigada de maneira muito potente, utilizando-se do cordel musicado por Sérgio Ricardo como uma camada da dramaturgia. Música que está como um recurso de comunicação elaborado e de extrema eficiência para conduzir também a parte da narratividade da peça.
Nessa obra, último romance escrito por Clarice Lispector, vemos as desventuras de Macabéa, uma jovem nordestina que vive no Rio de Janeiro sem saber ou mesmo questionar os porquês. “Virgem e inócua”, ela sente dores. Péssima datilógrafa, trocada pelo namorado que nunca o fora de fato, com cheiro ruim, cor de “burro quando foge”, Macabéa é daquelas que passam pela vida sem se dar conta do que é existir. Sua vida parece ter chegado a um beco sem saída até o momento de uma grande reviravolta.
Na obra Macabéa é alter ego de Clarice, que usa de um narrador fictício (outro alter ego), Rodrigo S.M., para colocar a própria construção da narrativa em perspectiva. Nesta adaptação, a Definitiva Cia de Teatro coloca a mesma perspectiva do ponto de vista da construção da narrativa teatral, assumindo os lugares tanto do escritor como dos personagens, usando a música como uma das camadas dessa escrita cênica.
O diretor da montagem, Jefferson Almeida, destaca que “a nós, mais do que a fábula aqui brevemente descrita, nos interessa levar à cena o encontro entre o artista – escritor – e a dificuldade de conformar em uma experiência estética o seu objeto de desejo – a obra; o exercício diário, exaustivo e quase aprisionador – quase, uma vez que através dele podemos vislumbrar um grito de liberdade – pelo qual passa Rodrigo S. M. em busca de dar voz ao grito de direito daquela nordestina, é uma imagem poética do trabalho de uma companhia de teatro que se dá a missão de conformar em um aparelho – o teatro – uma obra complexa no que tange as camadas da sua constituição”.
Mostrar a tentativa de Rodrigo é mostrar através de um exercício metalinguístico a tentativa da Definitiva Cia. de Teatro em contar A HORA DA ESTRELA, onde a música é parte componente da encenação, criando uma dramaturgia paralela ou uma escrita musical. Levado pela importância da música para a personagem central, viciada em rádio, e pela quantidade de músicas já criadas a partir desse último romance de Clarice Lispector, a Cia. se utiliza dessas canções – as criadas a partir do livro e as citadas no livro – para perguntar: “Como se constrói uma cena onde a música é a cena?”.
Está será a primeira vez que os atores da Cia. estarão em cena tocando instrumentos e executando a música em todas as suas instâncias. Em outras palavras, a música, aqui está em cena em toda a sua plenitude: o ato de tocar e fazer música é a cena e meta-cena, ou seja, em outra camada, serve de esteio onde repousa a vida ficcional das personagens.
Ficha técnica
Original: Clarice Lispector
Adaptação: Jefferson Almeida e Tamires Nascimento
Direção: Jefferson Almeida
Assistência de Direção: Tamires Nascimento
Direção Musical: Renato Frazão
Tap: Clara Equi
Cenário: Taísa Magalhães
Figurinos: Arlete Rua e Thaís Boulanger
Visagismo: Rodrigo Reinoso
Iluminação: Livs Ataíde
Elenco: Gustavo Almeida, Jefferson Almeida, João Vitor Novaes, Livs Ataíde, Marcelo de Paula, Paula Sholl, Tamires Nascimento e Yves Baeta.
Serviço
Local: Sesc Tijuca – Teatro I
Endereço: R. Barão de Mesquita, 539
Estreia: 20 de janeiro
Temporada: De 20 de janeiro a 19 de fevereiro
Horários: Sextas, sábados e domingos, 20h
Gênero: Épico
Duração: 90 minutos
Classificação: 12 anos
Preço: R$ 20 (Inteira), R$10 (Meia), R$5 (Comerciário)
Capacidade: 228 Lugares
JOÃO VITOR MONTEIRO NOVAES | [email protected]