Maquiavel tinha razão…

Por Paulo Moreira

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O pensador florentino Nicolau Maquiavel, que viveu de 1469 a 1527, escreveu algumas coisas em “O Príncipe”, sua principal obra, que se aplicam muito bem à situação que o Brasil atravessa atualmente. Em tempos de indignação com denúncias de corrupção, é reconfortante ler, em Maquiavel, que esses defeitos são naturais na condição humana.

‘Os fins justificam os meios’

O pensador florentino considera que a política está acima da moral: “os fins justificam os meios” é uma afirmação que pode ser considerada um resumo desse modo de pensar.

Quem assistiu ao filme “Lincoln”, de 2012, deve ter notado que aquele presidente dos Estados Unidos, hoje considerado um exemplo de político, recorreu à distribuição de cargos e até de dinheiro para aprovar a lei que aboliu a escravatura naquele país. Atualmente, ninguém pensa no ex-presidente americano como um corruptor, mas como o homem que acabou com a escravidão.

Em nosso país, estamos assistindo ao embate entre grupos que têm diferentes visões sobre o que é melhor para o país e que se acusam mutuamente de pensarem mais em si mesmos que na coletividade.

É muito difícil distinguir, nesse cenário, o que é indignação genuína do que é a busca de um argumento para derrubar o adversário.

Na verdade, pouco importa: talvez cada lado queira provocar indignação genuína no público para derrubar os adversários.

‘É melhor ser temido do que amado’

Hoje, no Brasil, vivemos um clima de “vale tudo”, e não estou me referindo ao MMA. Na verdade, alianças políticas são feitas e desfeitas com incrível facilidade, assim como acusações são trocadas e segredos escusos são expostos.

Maquiavel afirma que “é melhor a ser temido do que ser amado”. Em resumo, as pessoas tendem a manter suas alianças políticas não apenas pelos benefícios que elas trazem, mas pelo temor das consequências que o rompimento possa acarretar.

‘Faça o mal de uma vez só e bem, aos poucos’

Um conselho interessante de Maquiavel: “o bem deve ser feito aos poucos, e o mal, de uma vez só”. Nesse sentido, o governo deveria tomar atitudes impopulares de uma vez só, e ir distribuindo benefícios aos poucos, de forma que os últimos façam com que o povo se sinta compensado pelos primeiros.

‘Impossibilite a vingança’

Um dos conselhos mais chocantes de Maquiavel é que, quando precisar prejudicar alguém, o governante deve fazê-lo de tal forma que impossibilite a vingança. Nos séculos XV e XVI, isso significava, na maioria das vezes, matar não só o inimigo, mas também seus familiares e amigos mais próximos, de forma que não restasse ninguém para querer vingança ou que, se isso ocorresse, essa pessoa teria tanto medo do governante que deixaria os planos de vingança para lá.

Atualmente, sair por aí matando os inimigos e seus parentes não é a atitude mais comum, até porque a sociedade criou alguns mecanismos, como o sistema judiciário e a polícia, que tornam esse tipo de ação arriscado, mas permanece a tendência, no campo político, de tentar arrasar o adversário de tal forma que ele fique impossibilitado de reagir.

Maquiavel: ‘O bem deve ser feito aos poucos; o mal, de uma vez só’ (Ilustração: Reprodução internet)

Maquiavel: ‘O bem deve ser feito aos poucos; o mal, de uma vez só’ (Ilustração: Reprodução internet)

E nós com isso?

Em momentos como o atual, tendemos a acreditar que coisas como corrupção e traição política são típicos de nosso país, e que não existe solução.

Pois bem, indo de Maquiavel aos especialistas em Tecnologia da Informação, uma antiga piada perguntava quantos analistas de sistema eram necessários para trocar uma lâmpada. A resposta: “Nenhum. Eles redefinem a escuridão como uma característica do ambiente”.

No caso de nosso país, é preciso admitir que uma sociedade tão complexa sempre conviverá com alguma forma de corrupção. Então, é preciso definir que a corrupção é uma “característica do ambiente”.

Isso não quer dizer que o roubo será tolerado. Apenas que, pensando como Maquiavel, devemos fazer com que os corruptos sejam muito cuidadosos, porque, se forem apanhados, a punição será certa.

Mas sem a pretensão de acabar com o roubo. Isso porque isso exigiria dar um nível de poder muito alto a um determinado grupo, e como dizia John Emerich Edward Dalberg-Acton, “O poder corrompe. O poder absoluto corrompe absolutamente”.

Ou seja: a tentativa de escolher alguém com poder suficiente para acabar com toda a corrupção faria com que essa pessoa se tornasse corrupta.

 

PAULO MOREIRA | [email protected]

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6 Comentários

Pedro Paulo 26 de maio de 2017, 08:09h - 08:09

Alguns jornalistas rotulam-se intelectuais, mas são uma espécie de caricatas do real entendimento de alguns discursos, até mesmo de Maquiavel… Na verdade, como diria minha avó em Barbacena, “tem que comer muito angu para fazer um paralelo filosófico com os dias atuais”…
Que texto mequetrefe!

PAZ 25 de maio de 2017, 10:10h - 10:10

Vc escreveu isso? “Em momentos como o atual, tendemos a acreditar que coisas como corrupção e traição política são típicos de nosso país, e que não existe solução.”
NÃO TEM SOLUÇÃO? Triste pensar assim… Tem solução sim. Não ser egoísta e orgulhoso, será o fim de corruptos e corruptores.

Maniac 24 de maio de 2017, 05:54h - 05:54

Muito oportuno o que foi escrito por você, lembrando que não há nada de novo sob o sol.

Saulo da Prefeitura 23 de maio de 2017, 11:29h - 11:29

Está de brincadeira escolher o exemplo de Lincoln: que aboliu a escravatura, enquanto que no Brasil os nossos políticos aboliram a pobreza de suas famílias. Outra ofensa é desse comentário de dar analogia entre Lula e Lincoln: um foi estadista, competente enquanto o outro não passou de oportunista, incompetente e mal intencionado, usando de pequenas benesses para manter o povo humilde no cabresto (via bolsas famílias, etc).

Valmir 22 de maio de 2017, 12:22h - 12:22

Belíssima reflexão…Abraçao Paulo.

الفتح - الوغد 21 de maio de 2017, 10:59h - 10:59

O caso de Lincoln, com os fins justificando os meios, guarda uma certa analogia com o de Lula. O problema é que, nos dias atuais, espera-se que se escreva certo por linhas certas, coisa muito difícil de fazer quando há três poderes independentes e “desarmônicos” entre si, sendo cada um deles formado por membros com pensamentos diferentes e mesmo antagônicos entre eles… Getúlio Vargas teve que se valer do despotismo para implementar mudanças “na marra”, que contrariavam os interesses do grande capital e das relações de trabalho ainda em bases escravagistas. Será que conseguiria fazer isso com o Congresso funcionando e tendo que recorrer a conchavos, subornos e ardis que afinal inviabilizariam política e economicamente seu plano de governo?…

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