A luz difusa e laranja do fim da tarde refletia o brilho de sua roupa vermelha nos vidros dos prédios. Como um Tarzan metropolitano, rasgou no ar uma parábola acelerada até chegar ao topo do Flatiron.
– Ah, o Flatiron… isso sim era arquitetura. Grandes colunas gregas, essa fachada em calcário e terracota, pura beaux arts. Parece que desaprenderam a construir nesses últimos 114 anos. Não tenho mais nem vontade de andar por esses prédios gigantes no tamanho e minúsculos no estilo… que saudades de Henri Sullivan, Raymond Hood, Frank Wright…
A verdade é que o Homem Aranha andava cansado daquela vida de pular de prédio em prédio, feito um macaco bicolor. Seu terapeuta achava que era stress pós traumático após após o choque com o drone de uma loja de departamentos em plena Quinta Avenida. Talvez fosse isso. Ou talvez a descoberta que a Mulher Aranha andou subindo por paredes que não eram as suas.
Andou tomando alguns anti depressivos, mas isso o deixava meio lerdo, e volta e meia se esborrachava em alguma parede. Pegava mal para o seu marketing pessoal. Sabe como é, Nova York está cheia de câmeras por todos os lados. Se continuasse assim, uma hora haveria vídeos difamatórios no Youtube.
A vida não andava fácil, nem para o Homem Aranha.
Ligou para o Batman, para um bat papo:
– E aí Batman, tudo bem? Estou te atrapalhando?
– Não, tava só morcegando aqui.
– E o Robin?
– Está na sala, assistindo patinação no gelo.
– Então, ando de saco cheio de passar o dia todo pulando de prédio em prédio. Um tédio…. Queria fazer o que me desse na teia…
– Na telha, você quer dizer.
– Sei lá, talvez.
– Entendo o que você está passando, também estou achando minha vida muito cavernosa… Acho que a gente está precisando tirar umas férias, sair da rotina…Porque você não vai para a praia, ficar fazendo nada, só se balançando na rede…
– Balançando na rede eu acho que não é uma boa… Mas acho que preciso mesmo de umas férias. Não descanso desde 1962, quando o Stan resolveu me lançar no mundo.
– É meu amigo, faz meio século que a gente tenta salvar o mundo.
– E pelo jeito não estamos conseguindo… Aliás, não ando conseguindo salvar nem meu casamento. E se a gente trocasse de papel? Eu me visto com a sua roupa de morcego e você com a minha de aranha… Acho que vai ser legal dar um rolê por aí de bat móvel…
– Acho que não vai dar, Aranhoso, estou com uma pancinha meio avantajada, não vou conseguir entrar nessa sua roupa tão colada no corpo.
– Puxa Batman, você barrigudo? Mas você não dorme de cabeça pra baixo? Achei que tivesse os abdominais fortes…
– Estou com labirintite. Agora durmo numa cama box com penas de gansos selvagens que meu quiroprático recomendou. E com fragrância francesa contra ansiedade, porque o Robin anda numas de florais.
– Entendo. Bom, valeu o bat papo. Vou ligar pro Homem de Ferro e ver se ele não quer assumir o meu lugar por um tempo.
– Liga pra ele, mas acho que não vai rolar. Andou pegando muita chuva e ouvi dizer que está todo enferrujado…
ALEXANDRE CORREA LIMA| [email protected]