Brasfels fecha 80% dos empregos e pode reduzir ainda mais até março

Angra dos Reis – O bairro que existe nas proximidades do Estaleiro Brasfels, em Angra dos Reis, ficou parecido com as “cidades-fantasma” dos filmes de faroeste: quase tudo está vazio, inclusive os imóveis que eram alugados a empregados do estaleiro, a maior parte do comércio está fechada e o movimento de entrada e saída de trabalhadores se tornou uma fração do que era. Até o comércio ambulante que existia na entrada da indústria naval se reduziu a uns poucos vendedores, em comparação a um verdadeiro shopping a céu aberto que, nos tempos de glória do estaleiro, oferecia de cafezinho a acessórios de celular.

A razão para essa decadência é que, dos 15 mil empregados que tinha no auge de suas atividades, por volta de 2012, o Brasfels dispensou 12 mil – 80% do pessoal. As encomendas feitas ao Brasfels desapareceram, desde que a Petrobras interrompeu os investimentos, por causa das consequências da Operação Lava Jato.

A crise atingiu em cheio a economia de Angra dos Reis, onde vivem mais de oito mil dos cerca de 12 mil metalúrgicos que perderam seus empregos. A perda de renda dessa pessoa gerou um efeito dominó e reduziu o movimento no comércio e a demanda por serviços no município.

Além de Angra dos Reis, cidades vizinhas, como Rio Claro, também foram seriamente atingidas pela crise na indústria naval. A cidade da Serra do Mar, com menos de dezoito mil habitantes, tinha oito ônibus que iam e voltavam diariamente a Angra, levando e trazendo trabalhadores que estavam entre os melhor remunerados do município.

— Atualmente, apenas três ônibus fazem esse trajeto. Em conversa com o prefeito de Rio Claro, José Osmar, fui informado de que essa crise reduziu em cerca de 60% o movimento no comércio de lá — conta André Silva, diretor de Comunicação do Sindicato dos Metalúrgicos de Angra dos Reis.

Perspectivas sombrias

Se a realidade atual é ruim, as perspectivas são ainda piores. O estaleiro conta com apenas um serviço em andamento, depois da entrega do navio-plataforma MV-29, em agosto: é uma plataforma da Petrobras, a P-69. A entrega dessa obra está prevista para março ou abril do ano que vem, e não existe, até o momento, nenhuma perspectiva de novos contratos.

— Plataformas de petróleo não são algo que se compre de uma hora para outra. Se fosse haver um contrato novo em março, as negociações já precisariam estar em andamento — afirma André.

Ele acrescenta que a direção do estaleiro está se movimentando para conseguir contratos de reparos de plataformas, mas que isso seria apenas um paliativo para a unidade não fechar definitivamente as portas:

— Um reparo emprega 200 a 300 pessoas por um ou dois meses, enquanto a construção de uma plataforma emprega milhares por mais de um ano. Precisamos que essa atividade retorne ao normal, mas as duas plataformas que a Petrobras está pretendendo fazer no curto prazo serão encomendadas no exterior, ao que parece — afirma o sindicalista.

A esperança nas obras paradas

A possibilidade mais concreta de melhoria no nível de atividade do Brasfels é a retomada de quatro contratos que eram responsabilidade da Sete Brasil, uma empresa criada para contratar a construção de plataformas e arrendá-las depois à Petrobras. A Sete Brasil, com 29 contratos parados em todo o país, já provocou o fechamento de diversos estaleiros. De acordo com André, o Brasfels é o último ainda em atividade no Estado do Rio.

Os quatro contratos que estão suspensos garantiriam alguns milhares de empregos e mais ou menos três anos e meio de atividade ao estaleiro, segundo André.

No entanto, as possibilidades de que isso aconteça passam além da lógica da economia. André disse que o Sindicato dos Metalúrgicos de Angra dos Reis fez contatos com a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e a resposta foi de que seria necessário que houvesse algum tipo de influência política para que esse assunto fosse resolvido.

Isso gerou um movimento na cidade: uma comissão que reúne lideranças de diversos setores da sociedade, dentre eles igrejas, associações de moradores, Executivo, Legislativo, sindicatos e comércio, está preparando um grande ato para o dia 7 de outubro, quando haverá um abraço simbólico no Estaleiro Brasfels.

Em 5 de setembro, o prefeito de Angra dos Reis, Fernando Jordão (PMDB), acompanhado do secretário de Desenvolvimento Econômico, João Carlos Rabello e da deputada Federal, Soraya Santos, esteve em audiência em Brasília, com o presidente da República em exercício, Rodrigo Maia (DEM), para solicitar formalmente que a Petrobras volte a investir nas obras inacabadas de três plataformas do BrasFels e de um projeto que está pronto para a construção de outra. Além disso, o grupo solicitou ainda a Maia, que não libere o conteúdo local para construção naval em outros países.

Não é a primeira agenda do grupo com o Governo Federal para tratar deste assunto. Os dois temas são preocupações do prefeito de Angra, porque afeta diretamente a economia da cidade e a empregabilidade.

O Consórcio de Libra (sistema de partilha com cinco empresas que exploram petróleo no campo de Libra – a 200 quilômetros do Rio de Janeiro) já sinalizou que deseja construir suas plataformas na China, alegando custo mais baixo do que no Brasil e a Agência Nacional de Petróleo também já se manifestou pela liberação do Conteúdo Local, o que tiraria do país milhares de empregos afetando drasticamente o estado do Rio de Janeiro.

 

Parada na construção de Angra 3 também prejudica a cidade

A construção da usina nuclear Angra 3, que foi retomada no governo do ex-presidente Luís Antônio Lula da Silva (PT) era outro forte foco de geração de empregos em Angra dos Reis. Milhares de trabalhadores da construção civil estavam envolvidos no empreendimento, mas perderam seus empregos quando os serviços foram interrompidos.

Houve denúncias de corrupção envolvendo as obras de Angra 3 e o presidente da Eletronuclear na época, Othon Luiz Pinheiro da Silva, acabou sendo preso.

Com os escândalos e as dificuldades financeiras do governo federal, os serviços ficaram parados, mas agora surgem possibilidades de retomada. A Eletrobras, a Eletronuclear e a China National Nuclear Corporation (CNNC) assinam no dia 1º de setembro, em Pequim, um Memorando de Entendimento (MOU) de cooperação do setor nuclear envolvendo o Brasil e a China. O chefe da Superintendência Internacional da Eletrobras, Pedro Luiz de Oliveira Jatobá, representando o presidente da companhia, Wilson Ferreira Junior, e o presidente da Eletronuclear, Bruno Campos Barretto, participarão da cerimônia, que terá também a presença do presidente da República, Michel Temer, e do ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho.

O memorando cria a oportunidade de um aprofundamento da cooperação bilateral para uso da energia nuclear para fins pacíficos, destacando os interesses comuns em estabelecer futura parceria para conclusão de Angra 3.

Com isso, os dois países reafirmam a importância do papel da energia nuclear na composição da matriz elétrica e na redução das emissões de gases de efeito estufa, levando em consideração a competitividade econômica deste tipo de energia.

Esse será o terceiro MOU assinado entre a Eletronuclear e a CNNC. Durante a visita do primeiro ministro chinês ao Brasil, em 2015, foi firmado um MOU entre a Eletrobras, a Eletronuclear e a CNNC, visando à cooperação em temas do setor nuclear. Em dezembro de 2016, o presidente da Eletronuclear, Bruno Barretto, esteve em Pequim para reuniões com a CNNC e grandes bancos chineses – potenciais financiadores da conclusão de Angra 3. Nesta visita, foi firmado um MOU bilateral entre a Eletronuclear e a CNNC para pautar a cooperação na retomada das obras.

 

 

Por Paulo Moreira

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