A palavra e a flecha

by Diário do Vale

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Há três coisas na vida que nunca voltam atrás: a flecha lançada, a palavra pronunciada e a oportunidade perdida.

Diante disso é fundamental que se conheça a palavra antes que ela saia da boca, antes que se instale a dor, quando o objetivo for verdadeiramente a crítica lançada para aquele a quem se quer ajudar e não contra aquele a quem se quer agredir.

Vi acontecer algo exatamente dessa forma com uma pessoa muito especial, onde em um rompante de um impensado ato, esta se viu flechada por alguém a quem tanto admirava e numa situação esdrúxula, onde o arqueiro era alguém que sem nenhum preparo, desferiu a flecha que causou um lamentável estrago.

Muitas vezes atiramos os petardos sem medo, certos de que estamos “certos”, donos da verdade que somos, mesmo sendo reles mortais com tempo determinado para habitar este plano.

É por demais dolorido receber daquele a quem se gosta ou admira uma avalanche de palavras duras, insensíveis e, sobretudo, sem sentido. Quem age assim não percebe que um pequeno vazamento, eventualmente afunda um grande navio. E certamente foi isso que aconteceu, uma tolice se transformou no rombo que afundou o navio e este uma vez no fundo do mar, pouco ou nada será feito para tirá-lo de lá.

O dia a dia muitas vezes nos coloca em situações de decisões imediatas, de opções mínimas e quase todas incapazes de abarcar a verdade ou o que sentimos no fundo do peito. Assim, falamos o que não devemos, magoamos a quem não queremos, nos tornamos distantes daquele a quem queríamos gostar.

“Cuidado com aquele que tem a língua doce e uma espada na cintura. Um inimigo declarado é perigoso, mas um falso amigo é pior”. Não são poucas as vezes que estamos lado a lado com o inimigo. Muitas vezes velado ou este nem sabe que o é, da sua capacidade de ser ínfimo na sua sensibilidade, de não saber praticar um gesto de carinho ou mesmo quando erra não ter a capacidade de pedir desculpas ou perdão.

A supremacia do medo e do orgulho oprime, é a areia movediça que nos traga lentamente, empurrando para baixo corpo e alma.

É inequívoca a certeza de que somos os únicos responsáveis pelo mal ou pelo bem que acontece em nossas vidas. Isso me faz lembrar a frase antológica de Antoine de Saint-Exupéry, autor de O Pequeno Príncipe: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”.

E são inúmeras as vezes que não sabemos como cativar, como perpetuar uma relação dando a ela vida e força, alimentando-a no dia a dia com sorrisos e afagos. Muitas vezes achamos que estamos a frente, que somos donos da verdade ou do pequeno metro quadrado que imaginamos habitar. É triste achar que somos o baú do tesouro e ao abri-lo nos deparamos com bens que nada valem, meros badulaques que pareciam ser ouro. Sua tradução pode ser ouvida na música do mesmo nome, cantada por Raul Seixas, nela temos o perfil do que falo aqui. Uma música que tem uma letra riquíssima! É claramente uma crítica a vida da classe média da década de 1970, mas totalmente atual. O nome da música faz referência as falsas promessas dos alquimistas da Idade Média, que juravam poder produzir ouro. Esse falso ouro que era chamado de Ouro de Tolo.

É fato que essa letra ainda é muito atual, pois a sociedade ainda é assim. Podemos ver que os “cidadãos respeitáveis” continuam agindo da mesma forma, sem se importar muito com o que acontece ao seu redor, mas ao mesmo tempo não conseguindo se sentir felizes por completo. Preferem o “poder” a poder ser mais capazes de somar, pois dividir ainda é algo que para muitos é sinônimo de posse, mas não passa de puro egocentrismo.

Certamente que uma flecha só pode ser lançada se for puxada para trás. Sendo assim, quando a vida te puxa pra trás, com dificuldades, com dores e surpresas, significa que vai te lançar para algo grande, para cima. Apenas mantenha o foco e continue mirando sua rota, seu caminho.

Já aquele que lança a flecha, sem avaliação ou critério, talvez não saiba, não perceba que corre sério risco de acertar sua própria ignorância, padecendo de um mal quase sem cura.

Feliz daquele que pensa e reflete bem antes de falar, antes de fazer da flecha ou da pedra o seu instrumento de comunicação. Avançamos tanto ao longo das últimas décadas, temos hoje em nossas mãos aparelhos incríveis, capazes de revolucionar, de marcar momentos simples ou importantes. Podemos fazer uso das mais completas tecnologias para dizer ao outro que o queremos mais perto, que o desejamos mais próximo, que sua presença é fundamental. Mas não, na verdade muitas vezes usamos esses veículos para comunicar um erro, patentear uma falha e não para enaltecer um apoio, dividir um elogio, agradecer uma parceria.

Opinião

Todo mundo tem o direito de expressar a sua opinião a respeito de algum assunto, mas querer que essa verdade seja aceita é comportamento nefasto, típico daqueles que não enxergam além do próprio umbigo. Infelizmente nem todos têm a humildade de admitir os próprios erros e, principalmente, de aceitar que outra pessoa esteja com a verdade. Esse é um assunto muito delicado, algo arrogante, ação onde não se reconhece no outro a verdade e muito menos se consegue elogiar as suas conquistas. Para ele, ninguém é melhor e mais merecedor do que ele. Considera-se o dono da verdade, se recusando a ouvir a opinião alheia, exigindo que os outros escutem e aceitem a sua, é algo que levará o arqueiro ao ostracismo. Isto é narcisismo envolto em orgulho exacerbado, algo que é observado por meio da altivez no trato com as pessoas. Normalmente o olhar e o tom de voz denunciam quem assim age.

Para relaxar os músculos do coração e da alma nada melhor que ler o livro do Dr. Flávio Gikovate, “O Mal, o Bem e mais Além – Egoístas, Generosos e Justos”. Destaco aqui algo dito pelo Dr. Gikovate e que cabe perfeitamente dentro desse contexto: “O que leva as pessoas de ‘gênio forte’ a comportamentos no mínimo estranhos: berrar, espernear e blasfemar diante de acontecimentos inexoráveis, e contra os quais nada podemos fazer. Reagem como crianças que não podem ser contrariadas! Afinal de contas, isso é ser uma pessoa forte? Querer comandar os fatos da vida, querer influir em coisas cujo controle nos escapa, não é sinal de força, como também não é sinal de bom senso e sensatez. Talvez fosse muito bom se pudéssemos influir sobre muitas coisas que são essenciais. Mas a verdade é que não podemos. Isso nos deixa inseguros, pois coisas desagradáveis e dolorosas podem acontecer a qualquer momento. E não serão nossos berros que impedirão nossos filhos de se machucarem, nossos pais de morrerem, nossa cidade de ter enchentes ou desabamentos”.

Uma pesquisa descobriu que alguém com esses sintomas sempre se encanta por uma pessoa generosa e vice-versa, fazem um par “perfeito”, um precisa do outro para desenvolver suas ações de posse e doação.

No meu livro “O Que é o Amor, 101 Reflexões para se Viver Todos os Dias”, busquei colocar alguns pensamentos simples e objetivos como: “O amor perdoa e regenera para uma segunda chance”. Porque não tentar?

Perdemos muito tempo tentado provar algo que achamos que somos, nos enfeitando e escondendo atrás de uma máscara de carne e osso, porém, sem sensibilidade, sem a percepção de que o nosso tempo é muito curto e que devemos aproveitar ao máximo nossa passagem por aqui. Diante disso temos a oportunidade de sermos verdadeiros, amar aquele que está ao nosso lado, nos despirmos de todo o tipo de mal, nos desarmarmos para poder estar perto do outro e assim poder abraçá-lo, unindo o corpo ao corpo, sem armaduras, sem falsos e podres poderes.

 

 

ARTUR RODRIGUES | [email protected]

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3 comments

Eddyr o Guerreiro 12 de abril de 2017, 16:10h - 16:10

Sensacional. Um belíssimo texto que bate e pega ponto por ponto de quem realmente encara a vida como vida.

Luciana Lemos 10 de abril de 2017, 14:09h - 14:09

Perfeito!Uma reflexão radiante.

Maniac 9 de abril de 2017, 09:01h - 09:01

Excelente texto, sempre atual e despretenciosamente verdadeiro!

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