O inferno da Dilma em uma noite cheia de estrelas

by Diário do Vale

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Domingo passado a televisão estava estranha, incomum. Na TV aberta não tinha as bobagens do Faustão nem as matérias apelativas do Fantástico. A transmissão da votação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff dominou a telinha da manhã até a noite. Na Globo William Bonner comandava o Big Brother presidencial. O paredão para ver se a presidente fica ou sai da casa de vidros do palácio da Alvorada. Na Bandeirantes, que também transmitiu em tempo real, o mestre de cerimônias era o jornalista Ricardo Boechat.

Como jornalista, por dever do ofício, eu dava uma olhada de hora em hora. Quando a noite caiu começou o massacre. Para cada voto contra o impeachment havia dois, três votos a favor. Os deputados, vestidos de verde e amarelo, dedicavam seus votos à família, a cidade, ao estado. A turma de vermelho esbravejava e prometia o inferno para os traidores do paraíso socialista. Seria cômico se não fosse trágico.

Mesmo sofrendo ataques constantes Eduardo Cunha se mantinha imperturbável. O presidente da Câmara as vezes me lembra o Gru, aquele vilão do desenho animado “Meu Malvado Favorito”. Já quando ele dá aquele sorriso diabólico fica parecendo o Muttley. Muttley era o cachorro assistente do Dick Vigarista no saudoso desenho da “Corrida Maluca”. Sempre que o chefe se dava mal ele soltava uma risadinha. Cunha estava tendo a sua noite de glória. No final, quando saiu o resultado esmagador só ficou faltando mesmo a risadinha do Muttley: “Ki,ki,ki,ki!” Mas isso deve ter acontecido nos bastidores.

O impressionante é que o governo tinha tudo a seu favor. Para barrar o processo do impeachment bastavam 172 votos. Já para aprovar a oposição precisava de 342! Ou seja, o governo Dilma com todo o seu poder, a distribuição de cargos e ministérios, a doação de terras no Amapá, não conseguiu 172 aliados para votar a seu favor. Daí o desespero, a ira da turma de vermelho. Um deles, ao votar contra o impeachment, profetizou a queda da Rede Globo de televisão. É aquela história de matar o mensageiro das más notícias. A Band também transmitiu, mas ninguém ameaçou o Boechat.

Outro conclamou os “companheiros” a partirem “para a luta”. Não sei a que luta ele se referia. Será que era para saírem na rua assaltando bancos e sequestrando pessoas, como a companheira Dilma fazia no início de sua carreira política? Como diria o Gabeira, que também foi guerrilheiro: “O que é isso companheiro!”. Por volta das nove horas da noite os rumos já pareciam definidos. Terminei de jantar com o meu amigo Branco e saímos para caminhar pela noite de Pinheiral.

Estava uma noite linda, de céu cheio de estrelas. Júpiter brilhava ao lado da lua crescente como um diamante celestial. Para os lados do leste, Marte e Saturno formavam um triângulo estelar com a gigante Antares, no coração do Escorpião. Pinheiral, naquela noite de domingo, parecia uma cidade fantasma. Não tinha ninguém na rua, as pessoas trancadas dentro de casa com a televisão ligada. Os poucos bares, ainda abertos, tinham a televisão ligada, transmitindo, é claro, a votação do impeachment. Dobrando uma esquina passei por uma menina, de uns dezoito anos, que perguntava angustiada ao amigos: “É hoje que vão tirar a Dilma? Ela vai sair hoje?”. É por causa desse tipo de alienação que a nossa juventude virou massa de manobra para líderes religiosos e políticos.

Voltei para casa andando debaixo daquele tapete de estrelas. Minhas velhas conhecidas, Sirius, Canopus, Antares, Prócion. Elas cintilavam tranquilas, indiferentes ao que acontecia aqui embaixo. As 23h30 saiu o resultado do massacre. 367 votos a favor do impeachment e 146 contra. Pior do que isso só o sete a um da seleção na Copa de 2014.

Para o jornal francês Le Monde, Dilma foi para o inferno. O problema é que ela levou o Brasil junto com ela.

Massacre: Nem a oposição esperava uma vitória tão grande (Foto: ABr)

Massacre: Nem a oposição esperava uma vitória tão grande (Foto: ABr)

 

 

JORGE LUIZ CALIFE | [email protected]

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14 comments

sandra 23 de abril de 2016, 14:56h - 14:56

Podia ter sido diferrente … eu diria …. Se e para o bem de todos .., FELICIDADE GERAL DA NACAO
DIGA AO POVO QUE SAIO…. MINHA CULPA ……..MINHA PROPRIA CULPA….!!!!

sandra 23 de abril de 2016, 14:49h - 14:49

podia ter sido diferente .. a marriposa por nao ver a verdadeira claridade ..,bate a cabeca varias vezes na parrede. “minha culpa ……minha propria culpa “

Maniac 22 de abril de 2016, 15:00h - 15:00

Dilma is dead!

lila 22 de abril de 2016, 12:49h - 12:49

Jorge, eu sempre leio seus textos e acho super engraçados e com um tom meio bobo de ironia de quem vive mesmo no mundo da lua, nunca comentei mas este que me fez rir eu preciso escrever que com relação a alienados você esta coberto de razão mas esqueceu de ressaltar que a quantidade de pessoas com mais idade e certamente mais experiência, vivência e conhecimento era de grande número compondo o grupo de alienados, agora veja bem como alguns jovens podem evoluir se seus pais, avós, figuras televisivas etc, são tão arcaicos, desequilibrados e uns estão sempre na mídia destilando horrores, exemplo como o filho do Jair Bolsonaro pode ser um jovem decente e um tanto normal sendo educado no ambiente onde vive, lógico que tem também as gorjetas milionárias que transformam algumas pessoas. Gostaria de pedir que quando falar em alienação, desonestidade, baixarias, etc não atrele aos jovens nós, pelo menos na política e em alguns meios de comunicação e com os formadores de opinião não temos nenhum exemplo. Obrigada

lila 22 de abril de 2016, 12:58h - 12:58

Complementando o que escrevi acima, não me chame de alienada pelos erros de pontuação ou qualquer outro que tenha cometido no texto.

Aposentado 22 de abril de 2016, 20:23h - 20:23

Parabens lila pelo seu post

lila 23 de abril de 2016, 08:34h - 08:34

Aposentado, obrigada, e parabéns a você também, eu tenho acompanhado seus comentários. Um abraço.

Rodriguinho 22 de abril de 2016, 12:35h - 12:35

Le Monde e outros grandes jornais do mundo afirmam que o que se passa no Brasil é tentativa de golpe liderado por Cunha que arrasta consigo paus-mandados fieis e temerosos. Mas duvido que esse cara vá comentar isso aqui – há matérias em português sobre a opinião da imprensa internacional, portanto ser monoglota não é desculpa.
Agora, o Donald Trump do brejo desdenhar de Faustão e Fantástico? Defecar no prato em que come é feio…

Al Fatah 22 de abril de 2016, 21:03h - 21:03

Pede o cara logo em casamento! Só não acredito que ele aceite…

Aposentado 22 de abril de 2016, 09:19h - 09:19

Não teve as bobagens do Faustão nem as reportagens apelativas do Fantástico mas tivemos o maior besteirol dos últimos tempos que foram as falas desses deputados, a maioria corruptos querendo se aparecer para seus eleitores depois de anos de sumiço das bases a qual foram eleitos. Isso é Brasil onde elegem uma presidente que governa somente a favor de seus interesses e de aliados, e que tem um congresso dos mais corruptos do mundo, fazem cara de bonzinhos e a população alienada babam como se esses fossem o salvador da pátria. Assim continuaremos por longas datas e olhe lá se não for deitados eternamente em berço esplêndido.

Al Fatah 22 de abril de 2016, 21:23h - 21:23

O povo brasileiro é o mesmo de 10, 50, 100, 500 anos atrás? Eu penso que, em mentalidade, pouco mudou… Então, me desculpe o logro, o desengano, mas não há futuro. Só muda para quem é esperto e/ou inteligente para se destacar em meio à grande massa ignota…

Como eu sempre digo, o Brasil é composto por mais de 200 milhões de pessoas. Os políticos são em apenas algumas poucas dezenas de milhares. Façam as contas e vejam quem influencia mais nos destinos do país… Só como exemplo, por que é tão difícil controlar a inflação no Brasil? Será que os planos são realmente tão ruins, mesmo sendo engendrados por pessoal extremamente competente na área econômica? O problema é que os planos são como remédios, e o país um paciente: difícil saber sua reação à medicação. O brasileiro é comprador compulsivo, mas péssimo pagador, ao mesmo tempo em que quer o máximo lucro com o mínimo esforço. Não há moderação. Nosso problema é cultural, forma de ver a vida. Difícil…

lila 23 de abril de 2016, 08:17h - 08:17

Al Fatah, até o inicio de 2015 eu lia seus comentários e percebia um pouco de otimismo acompanhado de muito pé no chão também, depois comecei a perceber uma desesperança, você realmente acha que o pais não tem mais jeito mesmo? ou será que tudo que esta acontecendo não é o começo de uma nova era onde as pessoas comecem acordar e deixa de ser subservientes de políticos e parem de abaixar a cabeça e beijar a mão deles um como eu vi outro dia uma funcionária de uma padaria na Vila Santa Cecilia fazer e fiquei chocada por ainda existir esse tipo de pessoa?

Al Fatah 24 de abril de 2016, 14:42h - 14:42

Lila, eu sinceramente estou descrente. Não creio em mudanças radicais, só em paliativos necessários e convenientes, como seria a saída de Dilma para dar um novo ânimo ao país, caso realmente seja constatado afronta à Constituição… Mas já vimos esse filme com Collor, e nada mudou em essência. Já tivemos um ditador totalitário centralizador e um regime militar controlador, e nada mudou em essência. O país, quando cresceu, sempre o foi de forma induzida, nunca espontânea, nisso se assemelhando mais aos países comunistas que aos capitalistas da Europa, Japão e América do Norte. Vejamos como está o Leste Europeu hoje, na comparação com seus congêneres ocidentais…

Aqui na nossa região, vejamos quais são as grandes empresas. Algumas grandes ex-estatais, como CSN, Brasfels (antiga Verolme) e Eletronuclear. As demais são todas plantas fabris de multinacionais com matriz no exterior, à exceção da Votorantim, que surgiu lá no começo do século XX, ainda na República Velha. Isso sempre foi o reflexo do Brasil: intervencionismo estatal, capital estrangeiro e empreendedorismo limitado para quem não tem poder financeiro ou influência política, além de um povo que estende o chapéu em vez de arregaçar as mangas…

Maniac 24 de abril de 2016, 15:46h - 15:46

Para que as mudanças aconteçam é necessário educação, não apenas escolaridade e planejamento a médio e longo prazo. São fundamentos de civilidade que podem demandar gerações.

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