Vamos brincar?

Por Diário do Vale

“O menino tinha um carretel de madeira com um pedaço de cordão amarrado em volta dele. Nunca lhe ocorrera puxá-lo pelo chão atrás de si, por exemplo, e brincar com o carretel como se fosse um carro. O que ele fazia era segurar o carretel pelo cordão e com muita perícia arremessá-lo por sobre a borda de sua caminha encortinada, de maneira que aquele desaparecia por entre as cortinas, ao mesmo tempo em que o menino proferia seu expressivo ‘o-o-o-ó’. Puxava então o carretel para fora da cama novamente, por meio do cordão e saudava o seu reaparecimento com um alegre “da”. Essa, então, era a brincadeira completa: desaparecimento e retorno.” Freud, 1920
A referida brincadeira ficou conhecida como, Fort Da, a qual foi descrita por Sigmund Freud, médico neurologista criador da psicanálise, após observar o seu neto com menos de dois anos brincando repetidamente com um carretel na tentativa de elaborar a ausência e a presença da mãe – na leitura do pai da psicanálise. É interessante que observemos que os momentos de brincadeiras para as crianças são prazerosos, mas também são uma maneira de controlar ideias e impulsos que se não forem dominados, controlados e percebidos podem levar à angústia. Segundo John Locke, filósofo empirista, há a Teoria da Tábula Rasa, na qual o ser humano nasce como uma tábula rasa e as experiências, ao longo da vida, constroem sua personalidade. Sob essa perspectiva, pode-se afirmar que as brincadeiras infantis funcionam também como projeções para um futuro de aprendizado.
É por meio das brincadeiras que a criança descobre a si mesma e o mundo ao seu redor, considerando ser principalmente dessa forma que ela desenvolve suas potencialidades, sua criatividade e seu raciocínio. É interessantíssimo salientar que as crianças brincam e constroem o seu mundo por meio das brincadeiras, as quais são, muitas vezes, criadas e desenvolvidas no tempo ocioso. Atualmente, em tempos de uma sociedade extremamente competitiva, é comum que os pais queiram preparar os seus filhos para o futuro com aulas de artes marciais, robótica, programação, inglês, espanhol, francês e preencher o tempo “ocioso” dos filhos com inúmeras atividades. Temos dois problemas nesse tipo de postura, o primeiro problema é que os pais buscam preencher o tempo ocioso dos filhos porque eles não têm este tempo para se dedicarem aos pequenos – independentemente do tamanho e da idade, pois filhos precisam de dedicação -, para simplesmente brincar com os filhos; e outro problema é deixar a criança, o jovem estressados, demasiadamente ocupados, nesse víeis, o ócio nos causa medo, o ócio nos causa receio, o ócio nos convoca a olharmos para nós mesmos. Não sabemos o que fazer quando estamos sozinhos, conosco. Não nos bastamos?
Nossas crianças e nossos jovens sabem, nossas crianças e nossos jovens brincam, nossas crianças e nossos jovens inventam, nossas crianças o nossos jovens constroem suas criatividades, seus sonhos, suas utopias, suas metas. Mas, nós adultos, com nossos medos, com nossas angústias de um futuro que, efetivamente, não sabemos como e nem o que será, tentamos, hoje, controlar, preencher, administrar o tempo dos nossos jovens e de nossas crianças. Todavia, não podemos nos esquecer que é brincando que a criança e o jovem adquirem noções de tempo e espaço, é brincando que se amplia o vocabulário, é brincando que se descobre como as coisas funcionam, e é por meio das brincadeiras que, muitas vezes, temos a oportunidade de expressar os nossos desejos, sentimentos e percepções.
Dessa forma, podemos afirmar que as brincadeiras e o ócio tratam-se de atividades importantes e essenciais para o desenvolvimento infanto-juvenil. Cabe a nós a pergunta, “Por que o tempo ocioso nos causa tanto medo?”, “Por que é tão difícil lidarmos com os nossos silêncios, com os nossos pensamentos e nossos sonhos?”, será que se as crianças e os jovens tivessem mais tempo para ficarem à toa ou entediados elas inventariam mais travessuras, mais brincadeiras? Será que não sonhariam mais? E nós enquanto adultos, será que nos permitimos ficar à toa para brincar? Será que enquanto adultos estamos preparados para transformar o nosso tempo ocioso em um momento de contemplação da nossa própria história e de contemplação e admiração dos nossos próprios sonhos? Será que um tempo em que as crianças e jovens estão brincando, nós adultos, não poderíamos sonhar? Que tal brincarmos com os nossos filhos, com os nossos jovens? E se essas brincadeiras, por meio de experimentos, por meio de cartazes e empatias… Será não podem nos proporcionar um melhor desenvolvimento para o futuro?
Em tempos em que as redes sociais preenchem o espaço ocioso, inúmeros problemas acontecem, o médico Augusto Cury descobriu a Síndrome do Pensamento Acelerado que acomete a nossa juventude e nossos adultos com a necessidade que temos de sempre estarmos conectados, de sempre estarmos produzindo, ou seja, a sociedade contemporânea cobra de nós, jovens, adultos, pais, avós a necessidade de estarmos conectados, em estado de produtividade e nós, enquanto pais, exigimos isso dos nossos filhos. Mas será que não está na hora de parar para brincar um pouco? Não digo abandonarmos as redes sociais, mas talvez deixarmos em alguns momentos o celular em modo avião para podermos voar metaforicamente rumo às brincadeiras do presente que certamente potencializarão as nossas emoções para o futuro. Em épocas de tanta modernidade, será que as brincadeiras não são capazes de produzir um futuro melhor? Será que elas não nos aproximariam das nossas conquistas e dos nossos sonhos? Que tal tirarmos algumas horas este fim de semana para brincarmos um pouco com os nossos filhos, com os nossos adolescentes, com os nossos pais, com as pessoas que amamos? Será que estas brincadeiras não servirão de treino para o futuro? Pois certamente quando um leãozinho brinca com o leão ele está treinando para o seu futuro.

Vamos brincar?
Boa leitura, TMJ!

Raphael Haussman: Pprofessor, Coach, consultor e apaixonado por educação e desenvolvimento humano e, ainda, pai da Raphaela e do Theo, seus maiores referenciais de sucesso…

Nosso dicionário

Fort Da – “Fort!” e “Da!” São exclamações que Sigmund Freud ouviu de seu neto Ernst pronunciar enquanto tocava. Este par de palavras significa “ido” e “lá” – tornou-se uma abreviação para a repetição na primeira infância e para os processos primários que esse comportamento mobiliza.
Sigmund Freud – Sigismund Schlomo Freud, mais conhecido como Sigmund Freud, foi um médico neurologista criador da psicanálise.
John Locke – John Locke foi um filósofo inglês conhecido como o “pai do liberalismo”, sendo considerado o principal representante do empirismo britânico e um dos principais teóricos do contrato social.
Teoria da tábula rasa – Locke detalhou a tese da tábula rasa em seu livro, Ensaio acerca do Entendimento Humano (1690). Para ele, todas as pessoas nascem sem conhecimento algum (a mente é, inicialmente, como uma “folha em branco”), e todo o processo do conhecer, do saber e do agir é aprendido através da experiência.
Personalidade – Conjunto de qualidades que define a individualidade de uma pessoa moral.
Robótica – Robótica é um ramo educacional e tecnológico que engloba toda a história educacional e tecnológico que engloba computadores, robôs e computação.
Programação – Ciência ou técnica de elaboração de programas de computador.
Rede social – É uma estrutura social composta por pessoas ou organizações, conectadas por um ou vários tipos de relações, que compartilham valores e objetivos comuns.
Augusto Cury – Augusto Jorge Cury é também doutor em psicanálise, professor, escritor brasileiro e médico psiquiatra. É o autor da Teoria da Inteligência Multifocal e seus livros foram publicados em mais de 70 países, com mais de 25 milhões de livros vendidos somente no Brasil.
Síndrome do pensamento acelerado – É o resultado do excesso de atividades e de estímulos sociais que somos submetidos diariamente, e impede o desenvolvimento das funções da inteligência, como refletir antes de reagir, expor e não impor ideias, exercer a resiliência, colocar-se no lugar do outro.
Metaforicamente – Metáfora é uma figura de linguagem que produz sentidos figurados por meio de comparações implícitas. Ela pode dar um duplo sentido à frase. Com a ausência de uma conjunção comparativa. Também é um recurso expressivo.

Dica de leitura
Ensaio acerca do Entendimento Humano (1690) – John Locke
Você é Insubstituível (2002) – Augusto Cury

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4 Comentários

Bebezão 12 de dezembro de 2018, 11:44h - 11:44

Até que fim, Gugu não citou os comunistas , será que cansou ou está em evolução?

guto 10 de dezembro de 2018, 13:04h - 13:04

Essa obra de amor é educar através da brincadeira, pois educar é dar vida, mas o amor é exigente, logo, os país ou responsáveis pela criança devem brincar com elas, animando as crianças para a criação de novas brincadeiras e brinquedos!
Devem deixar as crianças brincar com outras crianças também, mesmo que as outras crianças não sejam assim tão boas e da mesma religião, pois não devemos separar antes do tempo o joio do trigo… O trigo e o joio crescerão juntos e nossa humilde missão talvez seja proteger o trigo como se fôssemos seu pai!
Devemos brincar, pois não devemos apenas valorizar os valores da mente mais do que os valores do coração. Só o coração une a ideia à realidade, o tempo ao espaço, a vida à morte e à eternidade! Aquelas crianças que ficam apenas no computador ou tablet, longe das outras crianças, cresce muito individualista e focada na mente, como um autista!
Devemos brincar, pois brincando a criança aprende que o todo é superior à parte. Procuremos sentir, profundamente, que fazemos parte da nação brasileira, que devemos respeitar as regras da brincadeira, pois a criança que não brincou na infância não conhece regras e quando se torna um adulto não respeita as leis e as regras da sociedade!

Alexsander 8 de dezembro de 2018, 14:14h - 14:14

É interessante notar que na biografia de Napoleão Bonaparte (escrita por Alexandre Dumas – cujo pai foi general comandado pelo imperador francês) há a descrição de que quando criança, na Escola Militar de Brienne, Bonaparte brincava com os colegas de batalhas campais, nos jardins cobertos de neve. E estes mesmos colegas, que quando adultos foram seus comandados, lembravam-se com assombro que as manobras vencedoras que garantiram a Napoleão o controle da Europa civilizada, eram as mesmas que ele havia esboçado em suas brincadeiras como criança…
É algo para pensarmos essa lição que a História nos deixou…

Cada um é cada um 8 de dezembro de 2018, 11:08h - 11:08

Meu filho mais velho fica bem sozinho, já meu mais novo odeia ficar sozinho, eu também gosto de ter momentos sozinha , já meu esposo odeia…
O mais velho tem muito da minha personalidade, gosta de ver filmes , ler livros , séries, caminhar refletindo, não gosta de rede sociais e nem de se expor…
O mais novo é impulsivo, adora aparecer e esportes.
Acho que tem muito a ver com a personalidade, além de outros fatores…

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