Por Folhapress
“O que está sendo feito para calar esse homem?”, perguntava um indignado rabino de Nova York, em 1959, quando Philip Roth surgia com seus provocativos textos que expunham a vida judaica nos Estados Unidos.
– Os judeus estavam genuinamente assustados com o que Roth escrevia. Muitos tinham chegado aos EUA havia não tanto tempo e as feridas da Segunda Guerra seguiam abertas – conta à reportagem Claudia Roth Pierpont (sem parentesco), autora de “Roth Libertado”.
O ensaio biográfico cobre a carreira do escritor desde “Adeus, Columbus” (1959) até “Nemesis” (2010). A análise literária se entrelaça com a também novelesca vida de Roth, considerado hoje o mais importante autor norte-americano vivo.
Pierpont, que escreve para a “New Yorker”, conheceu Roth numa festa, em 2002. Começaram, então, uma relação de amizade que tinha a troca de escritos como principal mote.
– Sugeri gravar nossas conversas. Em pouco tempo, vi que já tinha um livro – fala.
Questionada sobre sua proximidade com o personagem, Pierpont disse que seu trabalho não é uma biografia autorizada. “Ele não viu nada antes de ser publicado.”
De fato, apesar do tom elogioso ao descrever grande parte das obras, Pierpont não se furta a fazer críticas ou ir ao detalhe em passagens biográficas mais sensíveis.
É o caso do trágico laço do autor com Maggie Williams. Para Pierpont, “o casamento literário mais destrutivo e influente desde Scott e Zelda Fitzgerald”. Para convencer Roth a casar-se com ela, Maggie forjara um exame positivo de gravidez usando urina tomada de outra mulher.
– A degradação dessa união teve reflexo no modo como se relacionaria com as mulheres e como as retrataria em sua obra – diz Pierpont.
PRAGA
Após o sucesso e o escândalo causados por “O Complexo de Portnoy” (1969), Pierpont conta que Roth quis afastar-se da fama de escritor obsceno. “Ele não queria que as pessoas continuassem a vê-lo como um pênis ambulante.” No romance, Roth conta a história de um adolescente judeu que se masturba de forma quase ininterrupta.
A busca o levou então a Praga, onde escreveu um ensaio ficcional que Pierpont considera fundamental para a fase seguinte de sua carreira. Em “‘I Always Wanted You to Admire My Fasting’; or Looking at Kafka” (sempre quis que você admirasse meu jejum; ou olhando para Kafka), Roth imagina o que aconteceria a Franz Kafka (1883-1924) caso tivesse sobrevivido à experiência nazista e, refugiado, fosse ensinar hebraico numa escola em Newark, onde Roth poderia ter sido seu aluno.
– A reflexão que fez nessa viagem foi fundamental para criar Nathan Zuckerman, ‘alter ego’ presente a partir de ‘O Escritor Fantasma’ (1979) – conta.
“Roth Libertado” ainda examina as fitas em que o então presidente Richard Nixon surge preocupado com seus escritos e o flerte que o escritor teve com Jackie Kennedy.
Revela, ainda, que apesar da imagem de rebelde e de “pirata literário”, Roth tem um senso de autoproteção tão grande que os amigos fazem troça do fato de não largar seu frasco de álcool gel.
Aposentado e às vésperas de completar 82 anos, Roth tem agora dado entrevistas ao escritor Blake Bailey, designado para escrever uma extensa biografia autorizada, prevista para ser publicada daqui a dez anos.
‘Roth Libertado’
Autora: Claudia Roth Pierpont
Tradução: Carlos Afonso Malferrari
Editora: Companhia das Letras
Preço sugerido R$ 52,90 (480 págs.)