Sul Fluminense tem operação de guerra para o combate ao Covid-19

by Diário do Vale

Luiz Paulo Tostes Coimbra explica que a Unimed-VR criou centro de tratamento ao lado do Hospital para atender os casos com suspeita de Covid, e assim isolar qualquer contágio
(Foto: Arquivo)

Volta Redonda– Um paciente deu entrada na emergência em um hospital de Volta Redonda na semana passada, com um quadro agudo de apendicite ameaçando romper. A demora em procurar por assistência médica transformou um procedimento relativamente simples em uma situação de risco. E não foi o único caso. Médicos que trabalham em hospitais públicos e privados do Sul Fluminense vêm testemunhando um agravamento das emergências não associadas ao Covid19. Trata-se de uma perigosa reação a um outro surto que vem acometendo muitos pacientes da região: o medo da contaminação por coronavírus em unidades hospitalares.
O receio é compreensível. A cidade apresenta o terceiro maior número de casos confirmados entre os 92 municípios fluminenses, ficando atrás apenas da capital e de Niterói. O resultado fora da curva de crescimento do estado, no entanto, não guarda relação direta com algum foco local da doença, mas com o esforço que está sendo feito para a sua prevenção: o laboratório do Hospital Unimed Volta Redonda realizou 389 exames para diagnóstico da Covid19 entre os dias 20 de março e 4 de abril. O volume de testes realizados na região é quatro vezes mais do que a média do estado, onde um em cada 2.866 habitantes foi testado até o momento.
Do total de casos investigados, 58 deram positivos; 292, negativos; e 40 ainda estão em investigação. No período, de 13 internações, 12 pacientes receberam alta e um paciente de 76 anos morreu por complicação da doença.
— A minha percepção é que Volta Redonda está com o terceiro maior número de casos por realizar mais exames e não por ter mais infectados do que outros municípios. Sabemos que ainda há uma carência muito grande de oferta de testes. Mas aqui estamos testando bastante gente, até mesmo para que possamos ter um quadro mais claro sobre a situação — explica o presidente da Unimed Volta Redonda (Unimed VR), o médico pneumologista Luiz Paulo Tostes Coimbra.
Aos 65 anos, Tostes está entre os testes positivados para a doença.
— Eu fui assintomático. Acreditamos que muitas pessoas já tiveram contato com o vírus, mas são assintomáticas. Por isto é tão importante a realização de testes na população para que a gente possa avaliar melhor a doença e criar novas políticas públicas de enfrentamento do problema.
Enquanto a pandemia ainda não chegou ao seu pior momento, previsto para as próximas semanas, uma operação de guerra vem sendo realizada na região para o combate à doença. De fevereiro para cá, a rede Unimed teve sua estrutura ampliada, com uma nova UTI e a construção inclusive de uma unidade de apoio assistencial exclusiva para atendimento a pacientes com sintomas gripais, fechou parcerias público-privadas para abrir um Centro Especializado em Doenças Respiratórias e ampliar a oferta de leitos até nas regiões mais carentes do município, capacitou tecnicamente profissionais e elaborou uma série de protocolos para garantir a segurança de pacientes e equipes.
Até julho, a ampliação do hospital sede da Unimed irá garantir ainda novos 125 leitos. O esforço, no entanto, não garantirá resultados se a população não estiver com a saúde em dia, alerta o dirigente:
— As pessoas devem continuar cuidando de suas doenças crônicas e mantendo seus tratamentos médicos. Caso contrário, correrão um risco maior de enfrentar a forma mais perversa do covid19.
Em entrevista virtual, o diretor do mais importante hospital de referência da região Sul Fluminense e cofundador da Unimed-VR contou como a cooperativa, que começou com 30 médicos em 1989 e conseguiu, em 30 anos, ter 470 especialistas cooperados, 1600 funcionários e mais de 66 mil clientes, se preparou para enfrentar uma pandemia de proporções planetárias.

Antes de qualquer procedimento cirúrgico a equipe médica se prepara minuciosamente; a sala é esterilizada e são realizados checklists de equipamentos, dados vitais do paciente, exames, etc… Mas como uma unidade médica se prepara para receber uma pandemia até aqui desconhecida?

LUIZ PAULO TOSTES COIMBRA: – Eu acho que Volta Redonda vem se preparando há muito tempo e montou uma estrutura interessante e tem testado bastante gente. Nós começamos em fevereiro, diante das notícias que estavam sendo divulgadas no mundo e a chegada do Covid ao Brasil, decidimos que seria necessário aumentar a oferta de leitos de UTI, de respiradores, e também de treinar o pessoal, criar protocolos de atendimento. Criamos um centro de tratamento ao lado do Hospital para atender os casos que chegassem com suspeita de Covid. Assim, isolamos qualquer contágio.

O Gripódromo?

LUIZ PAULO – Sim. Ganhou este apelido da população (risos). A Unidade é exclusiva para pacientes com sintomas gripais, dando suporte ao Pronto Atendimento. A estrutura fica no espaço em que anteriormente funcionava um restaurante e conta com Repouso, Sala de Coleta e Posto de Enfermagem. A equipe é composta por dois clínicos, um pediatra, um enfermeiro e três técnicos, além de recepcionista, auxiliar de farmácia e higienização. A unidade foi montada em apenas três dias e contou com o envolvimento de diversas áreas da Unimed Volta Redonda. Inaugurada em 21 de março, até o dia 09, foram realizados 670 atendimentos.

E como ficou a oferta de CTI?

LUIZ PAULO – Nós estamos aumentando o número de leitos de CTI. Aumentamos em oito o número de leitos no CTI. Compramos mais seis respiradores e podemos, se necessário, transformar uma sala do centro cirúrgico para mais leitos de CTI. Além disto, nosso CTI de 21 leitos está quase vazio na expectativa de chegada dos pacientes de covid.

Em todo o país os profissionais de saúde representam 25% dos casos de contaminação por estarem na linha de frente do combate. Qual a situação entre seus profissionais?

LUIZ PAULO – Nós tivemos 91 colaboradores que apresentaram sintomas e foram imediatamente afastados. Deste número, 65 apresentaram resultado negativo para o exame e retornaram às suas atividades. Tivemos 9 positivos para COVID até agora. E temos 17 exames em andamento, ainda aguardando o resultado. Mas os números estão ainda bem abaixo da média nacional. A gente vem realizando uma série de ações para aumentar a proteção dos nossos colaboradores. Um grande número de funcionários administrativos nossos estão trabalhando em home-office, e a gente fez uma série de mudanças na rotina do hospital. Hoje, estamos gastando uma média de 1.500 máscaras-dia para a proteção dos profissionais.

Ainda assim, os senhores realizaram uma assembleia da cooperativa em plena vigência do decreto de isolamento social. Por que?

LUIZ PAULO — Primeiro, por que temos a obrigação legal como cooperativa, e como empresa de sociedade anônima, e por estatuto, de realizar a nossa assembleia até o final do primeiro trimestre. E essas informações têm que ser enviadas para a Receita Federal e para Rede Nacional de Saúde. Essa assembleia já tinha sido convocada com 46 dias de antecedência. Inicialmente a reunião seria em um teatro. Então o que decidimos? Trouxemos o encontro para a sede, solicitamos aos nossos cooperados de grupos de risco e os que apresentavam algum tipo de sintoma que não comparecessem, distribuímos álcool em gel e máscaras para os presentes e espaçamos as cadeiras. Acontece que o vice-presidente apresentou sintomas no dia seguinte da reunião e o exame foi positivo para covid. Além dele, eu e outro médico também fomos confirmados, mas não dá para dizer que foi em razão da assembleia. Havia mais de 200 pessoas no local e só nós testamos positivo. Sendo que, o médico que deu positivo também trabalha em emergências. Além disto, a mudança na regra que flexibilizou os prazos para assembleias só ocorreu no dia 30 de março, quando foi publicada uma alteração no Diário Oficial, permitindo que as assembleias de empresas fossem adiadas para junho. Não tínhamos como saber disso antes.

Como vem sendo a capacitação dos profissionais pra o enfrentamento da pandemia?

Ele vem sendo feito pelo nosso Instituto Lóbus. Estamos capacitando não só nossos profissionais como de outras regiões. Mas o instituto é anterior ao Covid. Criamos um Centro de Treinamento, que se transformou no Instituto Lóbus, que além de capacitar nossos profissionais, presta consultoria e treinamento à região. Pesquisamos em um raio de 150 quilômetros no entorno, desde o Vale do Paraíba paulista até a Baixada Fluminense no Rio, as necessidades dos serviços de saúde e desenvolvemos cursos, inclusive de pós-graduação, de Ensino à Distância, para atender a essas demandas. Também estamos produzindo pesquisas de ponta com nossos médicos e temos uma pesquisa na área clínica já publicada.

A exemplo de outras unidades pelo país, o hospital sofreu esvaziamento após as primeiras medidas de isolamento social?

LUIZ PAULO — Sim. O nosso hospital de grande complexidade, o Unimed Volta Redonda tem 150 leitos e uma taxa de ocupação geral em torno de 85%, mas estamos com 45%, ou seja, uma queda de quase 50%. O mesmo está acontecendo no nosso Hospital de Angra dos Reis, que é menor, para 50 leitos. O medo da população de se contaminar com o vírus ao procurar uma unidade hospitalar é tanto que o nosso pronto socorro que normalmente atende 400 pessoas por dia, está atendendo 100, uma queda de movimento de 75%. Isto é muito preocupante porque, por outro lado, os casos que chegam hoje na emergência, estão chegando mais graves. Isto porque as pessoas estão demorando a buscar socorro para outros problemas. E isto é muito preocupante. Um paciente de câncer, por exemplo, não pode suspender o tratamento. Para garantir isto, nós modificamos algumas rotinas. Há casos em que o paciente tem que vir até ao setor de Oncologia para realizar uma químio. Mas nos casos de medicação oral, estamos entregando o medicamento em domicílio. Para os pacientes que precisam tomar medicamentos injetáveis, criamos um drive-thru, em que o paciente chega de carro, a enfermagem vai até ele e aplica a medicação sem que ele precise desembarcar. O que as pessoas não podem é paralisar seus tratamentos.

E como manter esta estrutura toda funcionando com queda tão grande no faturamento?

LUIZ PAULO — É uma situação grave, porque, apesar da queda bruta no faturamento, eu tenho que manter plantonista, enfermagem, atendente. Isto sem contar o aumento absurdo nos preços dos Epis (equipamentos de proteção individual). A gente vem criando uma série de alternativas para driblar isto e sustentar nosso crescimento. Para cuidar disto a gente nomeou um comitê de crise e passamos a fazer reuniões virtuais. Esse comitê se reúne diariamente para traçar estratégias, até porque a situação muda de um dia para o outro. Tem dia que a gente tem que fazer duas reuniões, porque o cenário de manhã é um, à tarde, outro. Mas, para além da questão financeira, tem o problema da retomada, porque a pressão vai ser muito grande. Casos que estavam na fila de espera vão voltar e vamos ter que readequar todo o movimento para atender todo mundo. E a situação tende a piorar, com o período de outono/inverno, porque cresce a incidência de doenças respiratórias. A situação é preocupante e temos discutido muito isto com o Ministério da Saúde, com o estado e as prefeituras.

E como foi a parceria com o município para o combate à Covid19?

LUIZ PAULO — Nós fizemos uma parceria com a prefeitura e uma empresa dona de uma unidade no bairro Retiro que estava fechada. O dono cedeu o espaço, a prefeitura irá fazer a gestão do local e a Unimed VR irá custear os profissionais que estão trabalhando lá. A unidade já está funcionando, mas ainda com baixa ocupação.

E o futuro?

LUIZ PAULO – O futuro já está aí. Investimos cerca de R$ 47 milhões na ampliação da nossa sede que vai gerar um aumento de 120 leitos. A inauguração está prevista para junho, julho. Também investimos R$ 25 milhões em aparelhos para a radioterapia para o nosso setor de Oncologia e compramos inclusive um PET Scan digital. Além disto, pretendemos ampliar o nosso setor de transplantes para realizarmos também transplantes renais. Temos muito orgulho do nosso trabalho. Começamos em 1989 apenas com 30 médicos. Desde o início, nossa missão, muito mais do que uma operadora de saúde, nós somos uma cooperativa de trabalho médico. Os pilares do nosso trabalho têm sido, por um lado, a geração de trabalho o e renda para nossos cooperados, e por outro, um atendimento de saúde de qualidade para a população, o que q gente chama de jeito Unimed de cuidar. Hoje somos o hospital de referência em grande complexidade na região. O Hospital Unimed Volta Redonda é o único do interior do estado que foi autorizado a realizar Transplante de Medula Óssea, do tipo autólogo e alogênico com doadores aparentados e não aparentados. Desde 2012, a unidade está habilitada a fazer os procedimentos e já realizamos 49 transplantes. O primeiro Transplante de medula, do tipo alogênico (sem nenhum grau de parentesco com o paciente) aconteceu este ano. O doador foi encontrado no Redome – Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea. A doação foi feita por uma pessoa que mora na França.

*Por Elenilce Bottari (Agência de Notícias EuroCom),  jornalista com relevante experiência em cobertura de cidade, segurança pública, além de jornalismo investigativo. Foi por mais de duas décadas repórter do jornal O Globo, também passou pelas redações da Revista Veja, Jornal do Brasil e Rádio Tupi. Conquistou diversas premiações ao longo da carreira, como o Prêmio Esso de Reportagem, o Prêmio Esso de Jornalismo e o Prêmio Embratel de Investigação.

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4 comments

Vicente Jr 14 de abril de 2020, 00:13h - 00:13

Excelente matéria, de duas empresas de vanguarda! Diário do Vale sempre com seu jornalismo de qualidade e Unimed VR mantendo o protagonismo em saúde e a responsabilidade social tão importantes neste momento! Parabéns!

Luiz Antonio Machado 13 de abril de 2020, 11:47h - 11:47

Bom Dia!
Excelente reportagem. Show de informações Elenilce.

Capeta da grota do Santa cruz 13 de abril de 2020, 12:38h - 12:38

Ué mas o diretor desse hospital citado na matéria não disse que o assunto CORONA VIRUS estava sendo tratado de forma exagerada e que não era nada daquilo que se estava falando!!??? Ou seja quis dizer que o risco não era tão grande assim. Mudou de ideia?

Emir Cicutiano 13 de abril de 2020, 12:52h - 12:52

Outra ótima matéria! O Diário do Vale está resgatando seu jornalismo, e isso é bom…

A Unimed-VR é uma potência, um orgulho da cidade. Para além de prover a região de serviços médicos de excelência, gera centenas de empregos com remuneração acima da média do mercado de trabalho local. Também é um dos maiores empregadores diretos da cidade e da região, sendo um dos fatores de indução de desenvolvimento e novos negócios na área onde seu hospital está instalado… Empresa da cidade, sediada aqui, fomentando riqueza e renda para o município de Volta Redonda, e agora somando esforços contra o Covid. Sucesso e boa sorte para todos!…

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