Insatisfação com democracia põe em xeque sistema político, dizem especialistas

by Diário do Vale

Rio, São Paulo e Brasília – Pesquisa divulgada nesta semana pelo Ibope mostrou a insatisfação dos brasileiros com a democracia no país. O levantamento apontou que 83% dos brasileiros estão pouco ou nada satisfeitos com o funcionamento do sistema político. O índice de satisfação é o menor desde que o instituto iniciou a medição em 2008. O recorde anterior de insatisfação foi registrado em 2015, quando 81% declararam-se pouco ou nada satisfeitos com a democracia no Brasil, contra 15% que afirmaram estar satisfeitos ou muito satisfeitos. As informações são da Agência Brasil.

Para especialistas ouvidos pela Agência Brasil, o resultado da pesquisa mostra a insatisfação da população com as instituições do Estado e o impacto dos casos de corrupção investigados, além de colocar o regime democrático em xeque no país.

Na avaliação do cientista político e professor de jornalismo do Centro Universitário de Brasília (UniCeub), Vivaldo de Sousa, os dados da pesquisa revelam que turbulências políticas, como o cenário atual enfrentado pelo país, podem enfraquecer a democracia.
– É um dado preocupante. Fora que se tem uma parte importante da sociedade com essa avaliação e, com isso, se tem espaço para propostas autoritárias; me preocupa, porque a democracia, por mais falha que seja, é o melhor sistema político que existe – disse.

Foram ouvidas 2.022 pessoas em 142 municípios, entre 14 e 18 de abril. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

O Ibope perguntou também qual o sistema político preferido dos brasileiros. Quarenta por cento afirmaram que a democracia é preferível a qualquer outra forma de governo. Para 15%, em algumas circunstâncias, um governo autoritário pode ser preferível a um governo democrático, taxa inferior à registrada em 2014 (20%). Conforme o levantamento, o único índice que cresceu é a concordância com a seguinte frase: “Para as pessoas em geral, dá na mesma se um regime é democrático ou não”, que passou de 18%, em 2014, para 34%, em 2016.

Para o cientista político João Feres Junior, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp/Uerj), a taxa de apoio à democracia no Brasil é tradicionalmente baixa, em comparação a outros países, e isso tende a piorar por causa das descobertas e investigações de casos de corrupção, amplamente noticiadas pela imprensa.

– A cobertura política hoje em dia é basicamente a corrupção, então isso fica pior ainda. É natural que as pessoas vejam a democracia com descrédito e que tenha pessoas que fiquem falando que a ditadura seria melhor. Eu acho que é parte da intensa campanha de deslegitimação da política, que a mídia promoveu nos últimos anos, mais de uma década – opinou.

Feres Junior acredita que o período eleitoral é importante para a politização da sociedade, pois é o único momento em que a população tem acesso à informações políticas. Para ele, a baixa adesão à democracia também se deve ao fato de ser um conceito abstrato e estar pouco presente no dia a dia das pessoas.

– Para a vida cotidiana, não faz quase diferença nenhuma se está em um regime de uma maneira ou de outra, pelo menos ela [a sociedade] não consegue articular as diferenças de regime dessa maneira. Colocar essa questão dessa forma é muito intelectualizada. Para a maioria das pessoas, não é palpável, elas não têm contato com a democracia, com o Parlamento, nada disso; pelo contrário, o único contato que têm geralmente é por meio da mídia, que mostra que eles roubam o seu dinheiro. Para a maioria, é uma coisa exterior e ruim no dia a dia – avaliou.

De acordo com o professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, Paulo Silvino Ribeiro, a interpretação de que as instituições democráticas não funcionam é um elemento relevante para entender os dados da pesquisa.
– Se o Estado não tem condições ou não tem assegurado suas obrigações, e dada a frustração que as pessoas têm – seja em relação à crise econômica, seja em relação aos reiterados casos de corrupção que vêm à tona – contribuem para o descrédito da população em relação às instituições democráticas – disse.

– É preciso que se diga [que os casos de corrupção] não foram criados ou estimulados ou inventados pelo PT, mas estão aí há décadas, se pensarmos nesses últimos governos democráticos – acrescentou.

Autoritarismo

Em relação ao percentual de entrevistados que afirmaram preferir um regime autoritário ao democrático, Paulo Silvino Ribeiro avaliou que parte da sociedade tem interpretação equivocada do que foi a ditadura militar, por exemplo, no país, e aponta a ausência de engajamento político dos brasileiros.
– Essa porcentagem é uma leitura equivocada, faz sentido quando sabemos que, para o senso comum, foi no regime militar que houve relativo crescimento econômico, que haveria uma ordem – e quando falamos de ordem, falamos evidentemente de um policiamento mais ostensivo –, uma defesa de valores e noções absolutamente conservadoras e reacionárias, que transitam muito bem no imaginário social – falou.

Novas eleições

Conforme a pesquisa, 62% dos entrevistados disseram que preferem novas eleições presidenciais, que apontam como a melhor forma de superar a crise política. De acordo com o levantamento, 25% da população são a favor da permanência da presidente Dilma Rousseff e 8% acham que um eventual governo de Michel Temer resolveria a situação.
Para o cientista político João Feres Junior, o resultado de que 62% querem o fim do atual governo pode ser um reflexo da crise econômica.
– Essa coisa de quererem que o governo saia, provavelmente é o produto de uma certa crise econômica, quando a economia não está bem, e também do fato desse noticiário contra a corrupção – afirmou, Feres Junior.

Entre os que afirmam ter votado em Dilma na eleição de 2014, 45% apoiam a continuidade de seu governo e 44% preferem novas eleições. Por outro lado, 77% dos que dizem ter votado em Aécio Neves, que concorreu no pleito de 2014 pelo PSDB, acreditam que a solução para a crise política é a saída de Dilma e Temer, com a convocação de nova eleição presidencial.

De acordo com Feres Junior, esse tipo de pesquisa de opinião deve ser analisada também por outra ótica, que não a expressa diretamente nas perguntas. “De fato, a pesquisa mostra, e é inegável, que Michel Temer não goza de popularidade. Eu não sei quantas pessoas de fato o conhecem, nós que acompanhamos política sabemos quem ele é, mas as pessoas não sabem, votaram na Dilma. Não fazem a mínima ideia de quem é esse cara, só os antipetistas malucos que estão falando isso”.

Para Feres, isso mostra que um eventual governo Temer terá que lutar contra o desconhecimento ou mesmo a rejeição. “Outra coisa que o dado não mostra é se isso é desconhecimento ou se já é rejeição [a Temer]”.

– A análise mais direta é que a população prefere novas eleições. Dilma [Rousseff] ainda tem um eleitorado maior que o [vice-presidente Michel] Temer e há um percentual pequeno que acha que ele seria uma solução melhor que a presidente. No entanto, a população acha que nenhum dos dois vai resolver a crise que está aí – afirmou o professor do UniCeub Vivaldo de Sousa.

Impeachment

Para Sousa, o processo de impeachment de Dilma Rousseff não pode ser considerado um golpe, como defendem os apoiadores da presidente, e “mostra vigor da democracia porque está resolvendo isso com algo institucional”.

– Podemos criticar o Legislativo, mas o Supremo [Tribunal Federal] foi consultado, a presidente vai poder se defender. O termo golpe vem sendo usado pelo governo, pelo PT, do ponto de vista de campanha. As pedaladas [fiscais], na minha opinião, não poderiam ser consideradas como crime de responsabilidade – as pedaladas não seriam um tipo suficiente para embasar essa decisão. No entanto, o pedido de impeachment não é apenas legal, jurídico, é [também] um processo político – acrescentou.

Já o professor Paulo Silvino Ribeiro disse que a crise econômica “engrossa” o discurso pró-impeachment como solução para a situação política.
– Evidentemente uma nação frustrada e angustiada com tantos problemas sociais e econômicos acaba por engrossar o discurso e o coro pró-impeachment, porque entende que o impeachment seria uma moralização da política, seria o começo de uma nova era – disse Ribeiro, que não acredita que o país esteja vivendo o fracasso de governos democráticos, mas sim a dificuldade de consolidar o regime político.

– Nossa democracia ainda não construiu a imunidade necessária contra golpes. A democracia brasileira está em um processo de construção permanente. Acho que, por ser um processo em curso, o que temos é uma fragilidade que permite, portanto, que investiduras, projetos conservadores, autoritários e golpistas possam se organizar – observou.

You may also like

3 comments

VAI VENDO 30 de abril de 2016, 13:44h - 13:44

Estão investindo pesado na ideia de novas eleições. Acorde gente!

Essa é mais uma manobra para promoverem a impunidade, para acobertarem os corruptos.

Com novas eleições a Dilma poderá novamente ser reeleita e continuaremos na mesma podridão. Uma vez ele reeleita tudo o que as ruas promoveram de nada valerá. E além do mais é um motivo para abrir precedente para sempre ter novas eleições quando um governante corrupto estiver sendo investigado.

NÃO VAI TER GOLPE; VAI É TER EMPEACHMENT.

Fernando 1 de maio de 2016, 05:47h - 05:47

Não tem que ter golpe nem Impeachment tem que haver Justiça e cadeia para os envolvidos inclusive os que ocupam cargos públicos e que foram condenados porque penso que o exercício de quaisquer função pública necessita primeiramente de “idoneidade moral”.

VAI VENDO 1 de maio de 2016, 09:46h - 09:46

O TCU reprovou as contas da Dilma por unanimidade. As pedaladas dos incompetentes petistas foi como se RASGASSE A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL de 1988.

É por isso que a Dilma está sendo julgada, agora pelo empeachment – um julgamento político.

O que você acha da presidente desviar dinheiro dos clientes da CAIXA e do Banco do Brasil para pagar programas sociais do governo petista? Se Vc , seus parentes ou amigos têm conta nesses bancos , tiveram sues dinheiros desviados.

E dê graças a Deus que o TCU descobriu e a obrigou devolver, senão Vc, seus parentes ou amigos iriam ficar no prejuízo.

Vc apoia isto?

Comments are closed.

diário do vale

Rua Simão da Cunha Gago, n° 145
Edifício Maximum – Salas 713 e 714
Aterrado – Volta Redonda – RJ

 (24) 3212-1812 – Atendimento

(24) 99926-5051 – Jornalismo

(24) 99234-8846 – Comercial

(24) 99234-8846 – Assinaturas
.

Image partner – depositphotos

Canal diário do vale

colunas

© 2024 – DIARIO DO VALE. Todos os direitos reservados à Empresa Jornalística Vale do Aço Ltda. –  Jornal fundado em 5 de outubro de 1992 | Site: desde 1996